quinta-feira, 5 de junho de 2014

Leio YA, e porque não?

                Volta e meia na comunidade da internet aparece para nós um artigo reclamando do gênero Young-adult. Já li tantos deles (ainda não sei bem o porquê) que quase sei uma fórmula de cor para compor tal coisa. É bem fácil: diga que os livros são bobos, compare tudo a Crepúsculo e diga que adultos são bobos por ler livros como esses e não livros “sérios”. Termine seu artigo citando um livro “literário” que você leu e refletindo sobre a infinitude da vida que deve ser apresentada para todos os adultos, porque uma leitura adulta traz muito mais profundidade, é claro. Para a receita ficar ainda mais completa, você ainda pode adicionar de brinde que literatura Young-adult é tudo bem para adolescentes, porque afinal de contas, são bobinhos mesmo e gostam dos romances e de não lidar com a vida real, etc. Ainda acrescente uma dose de sua escolha falando que “cada um lê o que quer”, mas só mesmo para não ofender muito.
                Acho incrível como todos esses artigos são escritos no mesmo padrão e forma, como se fossem pré-fabricados como aqueles bolos de caixinha (e dos bolos de caixinha ruins, ainda por cima). No final de contas, a pessoa que o escreve sabe pouco mais que nada, e tenho a leve impressão que a maioria delas esqueceu aquele conselho que todas as mães nos oferecem bem cedo na vida: “burro calado passa por sábio”. Incrivelmente – e talvez não tão surpreendentemente – a humanidade ainda não aprendeu a lição que só podemos reclamar ou comentar sobre coisas das quais nós entendemos.
                Acontece que na literatura de hoje, o Young-adult é um gênero em expansão. Para você que está perdido, Young-adult é mais uma classificação do que um gênero em si, e é chamado dessa maneira porque os protagonistas das histórias tem em geral entre 13 e 19 anos. Uma classificação mais para vendas do que para o gênero da literatura em si. De acordo com as vendas de mercado, na verdade, 55% das pessoas que compram livros do gênero Young-adult (YA, para encurtar) possuem mais de 19 anos. Não é surpreendente, porque não é uma restrição de idade – não importa o que as pessoas insistam em classificar.
                O YA abrange todos os tipos de ficção e gêneros imagináveis – distopias, romances, fantasia, ficção-científica, literário, romance histórico, ficção realista, e por aí vai. Se você está procurando um gênero, pode acreditar que irá achar um livro classificado como YA.  Além disso, o YA trata sobre muitos problemas ‘sérios’ da sociedade – muitas vezes, é o primeiro contato que os adolescentes tem com problemas sociais, e é também uma maneira de aprendizagem. Não há nada errado em ler os "livros de adulto", claro, porque eles também nos fazem refletir - mas no caso, YA também pode fazer. No foco principal, não há uma diferença.
                Há um milhão de razões para defender-se o YA – é um gênero abrangente, com milhões de possibilidades, nunca sendo limitado. A cada dia é recriado algo novo, e a mais recente campanha, criada pelos próprios autores de YA, foi a “We Want Diversity” – campanha voltada para ver mais personagens de diferentes raças, etnias, culturas, orientação sexual e muitas outras diversidades. Na literatura tradicional, é necessário manter um padrão – os críticos regem o que deve ser feito e o que não. Já em YA, as barreiras são quebradas e ninguém se limita a somente um tipo de ideia.
                Não pode-se dizer que depois 1500 páginas de Harry Potter não aprendemos nada. No entanto, é nessa tecla que continuam a bater os críticos – que com os YA e livros de crianças, nada se aprende. É preciso ler livros de ‘adulto’. Porém, pela análise, os temas dos livros de adultos não se diferem tanto assim – em “A Culpa é das Estrelas”, trata-se o tema do câncer, em “Eleanor & Park”, uma adolescente vivendo em lar abusivo, e muitos outros temas como doenças, o amor, a família, a escola e também a vida. Afinal, a literatura em si não foi criada com um objetivo além de questionar todos esses parâmetros da sociedade – qualquer escritor tem isso em mente. No fundo, YA não tem nada de diferente do que qualquer outro livro que você pegar. Para qualquer tema que você encontra em um “livro de adultos” posso facilmente indicar um YA que irá tratar da mesma coisa.
                “Mas, ah, Laura, é para adolescentes, não pode ser sério!”, meu filho, vamos aos poucos. Aos 18 anos uma pessoa ainda é considerada um adolescente mas adivinha – ela já pode votar, ter carro e decidir o que vai fazer PARA O RESTO DA VIDA DELA. Isso em todos os países do mundo. Agora vamos lá – você acha que os adolescentes também são isentos de problemas? Não podem ser – porque eles também vivem no meio dessa mesma sociedade nossa. Não é só porque alguém é um adolescente que vai ficar magicamente imune a racismo, sexismo, problemas na família, pais abusivos, câncer, uma reputação tresloucada na escola, bullying, etc. Aliás, é na adolescência que a maioria de nós aprende a lidar com esses problemas que iremos enfrentar na vida adulta. O que voltamos a conclusão – a literatura adolescente não é nem um pouco diferente da literatura adulta.
                “MAS EXISTE MÁGICA!!!!!! NÃO PODE SER SÉRIO!!!! ADULTOS!!! VIDA REAL!!!!111!!!” Olha, nem vou discutir com você. Vou roubar a coisa do protagonista muito odiado/adorado de A Culpa é das Estrelas e dizer – é uma porcaria duma metáfora. Não é só porque uma coisa possui magia ou algo fantástico que é imediatamente invalidada. Os X-Men, por exemplo, foram criados como um paralelo de como as pessoas na margem da sociedade são tratadas. Novamente, uma metáfora. Se você não é capaz de ver além desses elementos que tecnicamente não existem, vou encerrar meu argumento por aqui e possivelmente nunca mais dirigir a palavra a você. Sério, vá se educar e ler um livro. Mesmo.
                Esses dois últimos argumentos são os mais usados para desconstruir a literatura YA – mas ao mesmo tempo, não possuem nada de extraordinário em si. O fato é que a literatura YA está fazendo um tremendo sucesso por aí porque consegue tratar de problemas sérios e conectar-se aos adolescentes – que de qualquer maneira, um dia serão o futuro do nosso mundo. Há milhões de razões pelo gênero YA ser algo em crescimento e que merece muita atenção, não só porque inicia cada vez mais jovens na leitura, como também por incitar a mudança numa sociedade estática.
                Sério mesmo – dê uma chance aos YA. Tenho certeza que vai achar lá algo para ser aproveitado. E se você é mais um desses adultos que acha que merece um troféuzinho por não ter chorado em “A Culpa é das estrelas” ou que adultos e adolescentes deveriam envergonhar-se dessas leituras, sinto muito dizer – mas sua vez está ficando para trás. E para ser bem sincera, não vejo a hora dessa paranoia “adultesca” acabar de uma vez por todas.

De alguém que lê tanto Dickens quanto John Green e gosta de ambos,

Laura

ps: não achei um título decente à postagem, vai ficar por isso mesmo
ps2: para os interessados, aqui está o artigo ridículo que me convenceu a escrever esse texto enorme. Não tem cabimento para o quanto me deixou irritada. Só leiam se vocês quiserem ficar bem frustrados mesmo.

E como não poderia deixar de ser, deixo-vos com links importantíssimos para vocês poderem se educar mais nos tópicos de young-adult.